Não podia fechar este ano sem mencionar dois nomes que marcaram este ano e cujas fotografias não apareceram na Esteira: Adi Hudea e Aylan Kurdi.
Adi Hudea, é uma menina síria de quatro anos, que no campo de refugiados de Atmeh, mostra a perda da infância, quando o fotógrafo turco, Osman Sagirli, ergue a sua máquina fotográfica para lhe tirar uma fotografia, ergueu ambas as mãos em atitude de submissão, de rendição.
Quantas vezes ela terá visto uma arma apontada a alguém? Quantas vezes terá assistido ao que uma arma de fogo pode fazer à vida de uma pessoa, para que ao confundir uma câmara fotográfica com uma arma dessas, perceber que as hipóteses de sobreviver aumentam se levantar os seus braços??
A imagem foi tirada em Dezembro de 2014, mas chegou em força aos media em Março deste ano.
Pouco tempo depois da divulgação da fotografia de Adi, era divulgada outra fotografia de uma menina síria, no campo de refugiados de Azrak, na Jordânia, que ao ser fotografada pelo alemão Rene Schulthoff, levantou também ela, os braços aos ar.
Aylan Kurdi, é um menino sírio de três anos, cujo corpo deu à costa numa praia turca, em Setembro.
Tal como Adi, é a posição do corpo de Aylan que diz tudo. Parece dormir, parece estar em paz, inocência em estado puro. Parece ter ainda em si, aquilo que Adi, já não tem: infância.
E são todos estes "pareceres" que revoltam e entristecem fortemente que vê esta fotografia.
Por Aylan ter perdido a sua vida, o seu dedo acusador é muito mais acutilante que as mãos levantadas de Audi, pesa-nos mais na nossa consciência. Pôs-nos à frente dos nossos olhos, a realidade que não queríamos ver.
Vi esta fotografia pela primeira vez num avião a caminho do Irão e senti-me culpado.
Hoje, ainda sinto essa culpa e ela vai perdurar.
A Síria foi uma questão do "deixa andar" por parte da Europa, da NATO. Todos os avisos estavam dados através dos refugiados que iam chegando à Europa, a Itália e à Grécia através do Norte de África nos anos anteriores. O número teve que aumentar para valores fora do controlo, para a Europa ter consciência do que se estava a passar e mesmo assim tardou em reagir.
Fazer mal ao mundo, magoar o nosso planeta, não é só quando o poluímos, provocamos alterações climáticas ou a perda da sua biodiversidade, é quando magoamos, alguém que pela sua inocência, pela sua pureza, nunca poderia ter sido magoado.
Que o digam Audi ou a Aylan, e tantos outros desconhecidos, porque não foram vistos e portanto não nos incomodaram.