sábado, 14 de novembro de 2015

uma música para o fim de semana - Rui Veloso


Creio que o Chico Fininho de Ar de Rock (1980) e o Mago do Bilhar de Mingos e os Samurais (1990), conhecem-se.
São amigos e colegas das noites obscuras. Partilham e palmilham a cantareira do Porto enquanto comentam a vida social bairrista das zonas onde moram Acredito que ambos vivem em pensões baratas, não muito distantes entre si.

Se o Fininho, sujo, esqueléctico e cor de pele cinzenta doentia, andava na noite decadente, e de dia arruma carros, o Mago do Bilhar, de roupa de mau gosto, corrente grossa ao pescoço, a exalar o perfume barato e pestilento vendido nas drogarias a granel, faz do dia a sua noite,

Este vive na noite das caves, cheias de densos e azulados fumos do tabaco, giz para os tacos de bilhar, cervejas pousadas por todo o lado e decoradas a vozes falando bem alto a qualidade das tacadas dadas, ao mesmo tempo que mandavam abaixo as dos seus oponentes.

Fininho e o Mago cruzam-se algures por aí nas vielas escurecidas e duvidosas. São irmãos do oportunismo e da necessidade. Mago dá dinheiro ao Chico para os charros e este provavelmente, dá nomes de alguns patos inocentes e fáceis presas para o Mago os comer numa mesa de bilhar e ganhar dinheiro para pagar as dívidas dos seus excessos.


Na semana passada tentei fugir às músicas mais batidas do álbum homónimo de RuiVelos escrevi que esta semana seria sobre, o que é para mim, o melhor álbum de Rui Veloso: Mingos e os Samurais de 1990.
De novo fujo aos temas mais batidos. Gosto muito da música do Mago de Bilhar. É ela a que escolho para este fim de semana, do álbum dos Mingos.


Bom fim de semana :)




O méno tinha um ar tranquilo 
E a calma dum falsário
Tacava suavemente e com estilo
Para enervar o adversário

Tinha já algo de artista
Naquele seu jeito de pluma
A sábia pose dum mestre bilharista
Que nem o próprio tempo esfuma

Ele uma vez deu cento e dez
Ele era o mago dos massés
Tabela seca, três tabelas, 
para ele não havia vielas
Ele tinha um pacto com elas
Tinha um pacto com elas

Ele tinha um ar tranquilo
E a ciência das tabelas
Tinha a luz, a classe e o estilo
Que há na poeira das estrelas

Tinha já algo de artista
Só pelo modo de andar
Podia até ser um vocalista
Nem precisava de cantar

Ele uma vez deu cento e dez
Ele era o mago dos massés
Tabela seca, três tabelas, 
para ele não havia vielas
Ele tinha um pacto com elas
Tinha um pacto com elas

Ele uma vez deu cento e dez
Ele era o mago dos massés
Tabela seca, três tabelas, 
para ele não havia vielas
Ele tinha um pacto com elas
Tinha um pacto com elas


quinta-feira, 12 de novembro de 2015

descrença



descrença

Parte, vai agora.
Foge da longa hora,
onde ninguém mora,
e ninguém te chora.

Vês o destino branco
de seta no flanco?
Faz morrer o encanto,
sentado no meu banco.

O futuro é tão fugaz,
inútil que é incapaz
de criar a ilusão que faz
de empurrar o que ali jaz.

Acreditar é mera visão.
No fim mora a ilusão,
o encarceramento e a prisão,
das esperanças que não são.

A esperança não é realidade,
um sinónimo de felicidade,
ou fim da tempestade,
apenas um esgar de liberdade


Inkheart





















quarta-feira, 11 de novembro de 2015

seis anos depois...





... a Esteira ainda mexe.

Nasceu, propositadamente, num dos dias mais emblemáticos e representativos do Outono: o dia de São Martinho.
O aroma das castanhas assadas envoltas na nuvens cinzentas traçadas pelas fagulhas libertas do carvão, pelo voltear dos assadores. A cor da casca castanha tornada superficialmente cinzenta, pelo carvão dos mesmos, os cones de papel dobrados no topo destinados a manter a temperatura das castanhas, que outrora eram feitos das listas das páginas amarelas (e também das brancas), e que agora contam notícias antigas de jornais diários.
Com muita sorte, ainda se ouvirá o pregão rouco dos homens e estridente das mulheres, que empurram os carrinhos onde assam as castanhas.

Por cada ano que passa, mais surpreendido fico com a resistência da Esteira.
Ela tornou-se parte de mim. Ao longo destes seis anos de matraquear teclas, foi tendo várias crises existenciais. A infância foi difícil.
Mas foi na adolescência que a Esteira ajoelhou algumas vezes e teve as suas maiores crises. Esteve para acabar. Chegou a ter data marcada um par de vezes.
Enfrentar uma folha de papel digital em branco é algo que intimida muito.
Ela é para mim como o zero da matemática, é o meu elemento absorvente da literatura.

Se fosse verdadeiramente uma folha, e não digital, de papel branco, elas seriam amachucadas, amarrotadas, ainda em branco e atiradas para o caixote dos papeis. Uma, e outra, e mais outra.
Mas nessas vezes, nesses becos escuros e aparentemente saída, algo surgia, um pensamento inquieto, irrequieto ou inspirador, uma poema sentido, uma música atraente ou uma fotografia poderosa, evitava o colapso silencioso do teclado.

A idade de um blog talvez seja como a dos animais. Lenta e titubeante no seu início e depois acelera, à medida que o tempo passa.
Com seis anos, a Esteira talvez esteja agora na sua meia-idade. Mais experiente. Mais sábia.
Até ver, sabe equilibrar-se na corda bamba da ausência de ideias.
Não é um blog de grandes e complexas reflexões, de tratados filosóficos ou textos mordazes e acutilantes. Não tenho essa habilidade ou capacidade. É apenas um... blog.

Acredito convictamente que um blog é algo profundamente autobiográfico. Qualquer que ele seja, seja quem for que o escreva, o quer que seja escrito, descrito, opinado ou ainda ilustrado.
A Esteira é o meu espelho sem que veja o meu rosto. Escrevo para me conhecer.
O que é capaz de demorar uma eternidade. Se ela for o suficiente...

Obrigado por andarem por aí :)


castanhas em dia de São Martinho



Micro-ondas porque sou preguiçoso e de pouca paciência...