Poderia ser um comício em que as palavras de ordem são dadas em por uma parede cerrada de cordas (quatro violoncelos e uma guitarra portuguesa) que suporta e dá força para a voz Mara Anadon as converter, declamar, espectacularmente, num cocktail de sabores tangueros e fadistas.
Que Mais Querem de Mim, é o primeiro tema do álbum (Re)Cantos da Alma de Davide Zaccaria e Maria Anandon, está recheado de emoção, revolta. É um desabafo, que por vezes parece bordejar, num deceptivo lamento meio choroso.
Todo o tema infunde uma sensação e atmosfera de inquietação, de não acomodação, de uma revolta mal contida.
A voz de Maria Anadon é visceral, incisiva, frequentemente cortante e os violoncelos não o são menos. Tudo nela, e neles, é determinação.
O controlo da voz é extraordinária. A forma como sustenta por duas vezes, sem hesitar, durante uns firmes e altaneiros dez segundos a palavra Enganar aos 2.15, e depois repete aos 3.17 com a palavra Levar, é espectacular.
Todo o ambiente deste tema infunde uma sensação de inquietação e de não acomodação,
E mesmo na parte final da canção ainda há uns resquícios, talvez mal guardados dentro de si, que são soltos de uma forma que faz lembrar o scat jazzístico, dessa inquietação, dessa inconformação que ainda estão por extravasar.
Parece o meu gato Mahler que depois de já estar dentro do meu carro de volta para casa, após uma ida à clínica veterinária, que acabou dez minutos antes, ainda vem a resmungar.
Bom fim de semana :)
De esperanças mil, eu trabalhei
De sol a sol e mais além
No mar
Dei mais um passo e ainda assim
Sei lá, que mais querem de mim
“meu ar”
Talvez minh’alma
Ou o que dela sobra
Longe, num torpôr, que sei
Não quer ir embora
E se ficasse de repente
Toda instinto, toda alento
E mudar
Beber a vida em longos tragos
Na solidão, não há calor
Só ar
Deixo andar
Que eu quero ver o acordar
De todos nós, que de dormentes
Ainda agora, no presente
Nos deixamos enganar
Deixo andar
Estou a ver o acordar
De todos nós, já não ausentes
Que lesados, descontentes
Não nos deixamos levar