sábado, 20 de julho de 2013

uma música para o fim de semana - Jorge Palma


Jorge Palma sabe bem o que diz. 
Uma página em branco tal como ele, para mim é como o zero na matemática. O elemento absorvente da multiplicação.

Uma página em branco, uma tela vazia, um pauta de música por escrever ou um bloco de pedra por trabalhar podem ser intimatórios para quem tem que criar algo a partir desse zero, desse nada.
Olhar para o branco e da cabeça não sair nada, não ter ideias para o preencher, para criar, é montes de "antes". Frustrante, desesperante, incapacitante, esgotante.

Frases escrevem e rescrevem-se. Apagam-se, muda-se a sua ordem. Parágrafos mudam de sítio ou desaparecem no nada.
Digitalmente amachuco e deito montes de páginas em branco para a reciclagem. Uma frase idiota que perdura dias a fio isolada ou mal acompanhada no topo de uma página sem fazer sentido. 
Por vezes quase textos inteiros mais brancos que uma página em branco que depois se esfumam no delete.
Olha-se, olha-se e a continuidade insiste em continuar uma descontinuidade. Ausente.

Por vezes rendemo-nos. O texto fica por escrever e o branco ganha. Ou então escreve-se algo por obrigação e o branco ganha na mesma.

Mas por vezes o preto das palavras e as cores das ideias ganham vida e contraste nesse branco absorvente e monótono.
Então a caneta desliza mais lenta que o fluir pensamento ou o clac clac dos dedos no teclado não o acompanham e as palavras ficam incompletas. Elas dão saltos de lógica e a sintaxe fica para trás com erros, com os acentos todos trocados, ausentes ou presentes onde não deviam.
Mas isso é bom. É mesmo bom.

Não é altura para parar. Nunca paro. É como os comboios, sempre em frente. O corrector ortográfico nas horas ou dias seguintes há-de de descobrir essa alegria furiosa em falta.
Nessa mesma altura o branco deixa de ser branco, ganha vida e personalidade. 
Torna-se um livro intemporal, um quadro que entra para a história, um concerto memorável  ou uma estátua para a posteridade.

No fim, fica o orgulho de se ter vencido o elemento absorvente da literatura. No meu caso, aquele calorzinho bom de ter escrito um texto que gosto. Seja ele ou bom, goste ou não goste quem o lê, eu gosto dele. 
Fico a olhar para ele a saboreá-lo letra a letra. Tal como um cozinheiro no seu prato, faço pequenas modificações. Uma vírgula, um ponto final, tornar uma palavra mais bonita ou acessível para quem lê. Uma frase que está longa demais que pode ser encurtada ou que pode ser mais figurativa.

No meu caso também fica um cansaço interior. Durante algum tempo tenho que recuperar desse esforço. Frequentemente estou alguns dias sem escrever.
Mas o objectivo está lá, a página em branco ficou conquistada.

Tal e qual como este post e a canção (do álbum Com Todo o Respeito de 2011) de Jorge Palma sobre a qual ele versa - Uma Página em Branco. Gosto dele e gosto dela.

Bom fim de semana :)




Tenho uma página em branco
e uma guitarra na mão
ando nisto há quatro dias
e não me sai a canção

os cinzeiros já não chegam
tenho que os despejar
pensei que um copo de vinho
pudesse vir a ajudar

mas só fico atordoado
sinto o vapor a subir
imagino um crocodilo
estupidamente a sorrir

o piano ficou surdo
não me dá atenção
essas musas, essas bruxas
roubaram-me a inspiração

eu vou mas é descansar
deixar tudo espairecer
entre os cantos de uma folha
tudo pode acontecer

neste grande espaço em branco
só te quero dizer
nannanan
gosto de ti

Tenho uma página em branco
gostava de a preencher
sem rabiscos estes dados
são coisas para eleger

uma simples mancha negra
pode ser solução
perspectiva actualizada
desta minha situação

tenho uma página em branco
e sinto a barba a crescer
há tanta coisa a tratar
há tanta coisa a aprender

o relógio já me disse
nunca olhes para trás
e o ponteiro das horas
insiste em não me deixar em paz

eu vou mas é descansar
deixar tudo espairecer
entre os cantos de uma folha
tudo pode acontecer

neste grande espaço em branco
só te quero dizer
nannanan
gosto de ti

neste grande espaço em branco
só te quero dizer
nannanan
gosto de ti


terça-feira, 16 de julho de 2013

série "Vencedores"- Carlos Sá





Este senhor é um ultramarotonista. Isto significa que papa maratonas (42 km) ao pequeno almoço.
Carlos Sá acaba de ganhar aquela que é considerada uma das provas mais duras do mundo. 

A Badwater é uma maratona de 217 km (!) que é corrida no Parque Nacional do Death Valley no estado da Califórnia, Estados Unidos, com temperaturas a rondar os 50º (!) e humidade 0% (!).
Correu durante quase 25h. Mais concretamente em 24h 38min e 16s.
Resta dizer que esta ultramaratona começa a 86m abaixo do nível do mar na Baía de Badwater e acaba no monte Whitney a 4421m.
Nem consigo imaginar o que é correr nestas condições.

Tiro o meu chapéu a este senhor. Um grande, grande vencedor.


segunda-feira, 15 de julho de 2013

série "estatísticas da vida" - XLVII


Ou então, como me aconteceu há muito pouco tempo:

- O Pedro é vegetariano, certo?
- Sim sou.
- Não come carne portanto.
- Nem peixe, marisco e afins.
- Sim naturalmente. O peixe está incluído.
Entretanto rabisca umas coisas durante alguns segundos no papel, depois levanta os olhos para mim e pergunta:
- Nem atum??