sábado, 24 de novembro de 2018

uma música para o fim de semana - Samuel Úria


Gosto da tristeza, da dolência, da lentidão da voz Samuel Úria a cantar Vem de Novo.
Fez-me sentir saudades de quem já não volta.

A solidão não é não ter amigos, não é não ter quem olhe por nós. Solidão é quando se perde algo mais importante que nós próprios. É quando se sabe, se percebe que esse bocado a menos não será preenchido, não será recuperado. Será sempre um vazio.

É quando o vem de novo, jamais poderá acontecer porque o "de novo" é uma impossibilidade física.
Aí está-se verdadeiramente só. Mesmo quando há um milhão de pessoas à volta, porque nenhuma delas é o "de novo".

Vem de Novo é a quarta canção de um EP - Marcha Atroz - de Samuel Úria que ainda não tem um mês de lançamento.
É a segunda vez que Úria pisa o placo da Esteira.


Bom fim de semana ☺



VEM DE NOVO E se eu... E se eu me esquecer de ti? Mas não dessa forma que o fiz (Isso fui só eu a ser só eu). Mas, se se enrugar a noção do meu melhor, Vem, de novo, deseducar-me de estar só. E se tu... E se te apagares de mim? Mas não como às vezes pedi (Isso fui eu só a ser eu só). Ai, se se enrugar a noção do meu melhor Vem, de novo, curar-me o vício de estar só. E se o que eu pagar P’lo que não dormi For reencarnar Nas memórias de um puto sem jeito nenhum? E se o que eu pagar P’lo que já esqueci For perder o pavor de perder-te Por nem saber quem és? Pois, se se enrugar a noção do meu melhor, Venho, velho, desconhecer que nada sou. Mas se se enrugar a noção do meu melhor Vem, de novo, deseducar-me de estar só.



quinta-feira, 22 de novembro de 2018

um poema de... Mário Sá Carneiro


Dispersão

Perdi-me dentro de mim
Porque eu era labirinto
E hoje, quando me sinto.É com saudades de mim.

Passei pela minha vida
Um astro doido a sonhar,
Na ânsia de ultrapassar,
Nem dei pela minha vida...

Para mim é sempre ontem,
Não tenho amanhã nem hoje:
O tempo que aos outros foge
Cai sobre mim feito ontem.

(O Domingo de Paris
Lembra-me o desaparecido
Que sentia comovido
Os Domingos de Paris:

Porque um domingo é família,
É bem-estar, é singeleza,
E os que olham a beleza
Não têm bem-estar nem família).

Pobre moço das ânsias...
Tu, sim, tu eras alguém!
E foi por isso também
Que me abismastes nas ânsias.

A grande ave doirada
Bateu asas para os céus
Mas fechou-se saciada
Ao ver que ganhava os céus.

Como se chora um amante,
Assim me choro a mim mesmo:
Eu fui amante inconstante
Que se traiu a si mesmo.

Não sinto o espaço que encerro
Nem as linhas que protejo:
Se me olho a um espelho, erro
Não me acho no que projeto.

Regresso dentro de mim
Mas nada me fala, nada!
Tenho a alma amortalhada,
Sequinha dentro de mim.

Não perdi a minha alma,
Fiquei com ela, perdida.
Assim eu choro, da vida,
Eu nunca vi... mas recordo

A sua boca doirada
E o seu corpo esmaecido,
Em um hálito perdido
Que vem na tarde doirada.

(As minhas grandes saudades
São do que nunca enlacei.
Ai, como eu tenho saudades
Dos sonhos que sonhei!... )

E sinto que a minha morte —
Minha dispersão total —
Existe lá longe, ao norte,
Numa grande capital.

Vejo o meu último dia
Pintado em rolos de fumo,
E todo azul-de-agonia
Em sombra e além me sumo.

Ternura feita saudade,
Eu beijo as minhas mãos brancas...
Sou amor e piedade
Em face dessas mãos brancas. . .

Tristes mãos longas e lindas
Que eram feitas pra se dar
Ninguém mas quis apertar
Tristes mãos longas e lindas

Eu tenho pena de mim,
Pobre menino ideal...
Que me faltou afinal?
Um elo? Um rastro?... Ai de mim!

Desceu-me nalma o crepúsculo;
Eu fui alguém que passou.
Serei, mas já não me sou;
Não vivo, durmo o crepúsculo.

Álcool dum sono outonal
Me penetrou vagamente
A difundir-me dormente
Em, uma bruma outonal.

Perdi a morte e a vida,
E, louco, não enlouqueço...
A hora foge vivida
Eu sigo-a, mas permaneço ...

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Castelos desmantelados,
Leões alados sem juba...
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terça-feira, 20 de novembro de 2018