sábado, 21 de fevereiro de 2015

uma música para o fim de semana - Pedro Jóia


Um músico e um instrumento.
Uma conversa prévia, um cumprimento entre eles.
O dedo toca na corda e solta-a. A primeira nota soa e antes de ouvirmos a segunda, tornam-se um só, apenas instrumento.

A audiência desaparece. Para eles que são um só, nada mais importa. Dura alguns minutos.
No fim, acordam desse mágico torpor e despertam, abrindo ligeiramente a porta do seu esconderijo para receber um aplauso que soa lá ao fundo.

Para eles que são um só, o que mais desejam é regressar por onde vieram. Fecharem a porta como uma cortina transparente que faz de novo desaparecer a audiência, para minutos depois, de novo, receberem outro aplauso distante.

Um sono frequentemente interrompido por um despertador feito de muitas mãos inquietas e das quais eles fazem um snoose ao despertador.
Aquela soneca breve que vai adiando o definitivo acordar vezes sem conta.
Evitar aquele acordar que nos interrompe os sonhos. Aquele acordar na altura em que eles quando são um, voltam de novo a ser dois e se retiram do palco.

É isto que acontece com qualquer músico que ame o seu instrumento.
Pedro Jóia e a sua guitarra em Dança Palaciana não são excepção.


Bom fim de semana :)




quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

o circo e os animais





A parede não o deixa recuar mais. Está acorrentado a uma bicicleta caída sobre si. Seu instrumento de trabalho e tortura. Está encurralado e não pode fugir. Tem um olhar de medo profundo. De pânico. De quem sabe o que vem a seguir.

Quem vê esta fotografia, não pensa que quem, sim é um quem, vê o homem a aproximar-se dele, sabe que vai doer, sabe vai ser magoado e tem medo disso.
Medo verdadeiro. Ele sabe, ele reage, ele pensa. Ele sente.

É um macaco. Mas é um ser senciente. Tal como nós. Sabe o que é bom e o que é mau. O que o conforta e protege e o que magoa e assusta. Tal como nós.
Sabe avaliar o meio que o rodeia e reagir perante ele. Tal como nós.

Está num circo e é treinado brutalmente e cruelmente. A não obediência implica mais dor, a não aprendizagem implica mais castigos.
Quem está na assistência não pensa nisto, ou não quer pensar, não sabe, ou não quer saber.
Isto não se passa à frente dos olhos que o vêm na pista de um circo.
A assistência só vê o lado colorido de um animal que é fofo, exótico, que faz coisas engraçadas com a bicicleta e a faz rir. Aplaudem e apontam o dedo e dizendo - “Olha o macaco, olha o macaco na bicicleta!!”

Mas o macaco que os diverte paga um preço pesado.
Paga com a sua liberdade. Paga com o confinamento a uma jaula quase tão pequena como ele. Paga com tristeza, dor, sofrimento e medo.
Com uma vida mais curta que o normal. Paga por não estar no seu habitat natural onde pertence. Por não comer o que ele sabe que devia comer.

Quem vai ao circo com animais contribuí para que animais como este macaco, sejam mantidos como ele e paguem da mesma maneira que ele paga.
Por isso os circos com animais têm que acabar.

Porque são lugares cruéis. Onde não há respeito, carinho e ternura por eles.
Onde estão impedidos à força, à bruta, de ser o que a sua natureza lhe diz para ser.
Quem não percebe isto, que veja esta fotografia e se ponha no seu lugar. Fique acorrentado, entalado entre uma parede e uma ameaça com um chicote na mão.
Que substitua o olhar apavorado de um animal senciente por outro olhar apavorado de outro animal senciente. 
O que lê este texto.



A fotografia do chinês Yongzhi Chué a vencedora do World Press Photo 2015 na categoria Nature.
Retrata a aproximação do treinador Qi Defang ao macaco que é exibido num circo de Suzhou, Anhui province, China