sábado, 16 de novembro de 2013

uma música para o fim de semana - Penicos de Prata





Música erótica e satirica portuguesa. Talvez um conjunto de Bocages em versão de concertante e igualmente desbocados.
Tal como os Uxu Kalhus e os Diabo na Cruz, os Penicos de Prata souberam reinventar os diversos géneros da música portuguesa, traçar um novo possível caminho para ela e ao mesmo tempo encontrar um nicho só para eles.

Os Penicos de Prata são assim. Tocam a brincar, mas seriamente. As letras são palavrosas mas não ofensivas. Dizem coisas sérias em tom de brincadeira, exigindo inteligência para se conseguir o que os Penicos de Prata buscam e muito provavelmente encontraram.
São um quarteto só de cordas. Violoncelo, guitarra, ukelélé e contrabaixo. Cruzam a música de câmara com a música tradicional portuguesa.
Não sei se terão um grande público, mas vendo o caminho que decidiram trilhar, certamente que não será as grandes audiências e as grandes vendas que os motivam e provavelmente nem estarão muito preocupados com isso.
Creio que tocam para se divertir, inovar e ao mesmo tempo chocar ou abanar um pouco alguns preconceitos musicais, típico objectivo da poesia erótica e satírica.

A letra de - Balofas Carnes - é de um poeta português modernista, contemporâneo e amigo de Fernando Pessoa, chamado António Botto (1897-1959). Era assumidamente homossexual, apesar de casado por toda a sua vida com Carminda Rodrigues e a sua obra reflectia essa a sua natureza.

Caracterizava-se pela boémia, pela sua inteligência, pelo seu humor incisivo e mordaz e por dizer o que não devia e nas alturas em que menos o devia fazer. Foi esse o motivo do seu despedimento na função pública (escriturário). Foi acusado de desrespeito ao seu superior, indisciplina, escrever e declamar poesia nas horas de expediente e insinuações de carácter homossexual a um colega de trabalho.

O poema Balofas Carnes que os Penicos de Prata cantam hoje foi retirado do seu livro de poesia mais conhecido e polémico, Canções. Fernando Pessoa traduziu-o para em inglês em 1930.

Bom fim de semana :)





Balofas carnes de
balofas tetas
caem aos montões
em duas mamas pretas
chocalhos velhos a
bater na pança
e a puta dança.

Flácidas bimbas sem
expressão nem graça
restos mortais de uma
cusada escassa
a quem do cu só lhe
ficou cagança
e a puta dança.

A ver se caça com
disfarce um chato
coça na cona e vai
rompendo o fato
até que o chato
de morder se cansa
e a puta dança.

Os calos velhos com
sapatos novos
fazem-na andar como
quem pisa ovos
pisando o par de cada
vez que avança
e a puta dança.

Julga-se virgem de
compridas tranças
mas se um cabrito
de cornadas mansas
Julga-se virgem de
compridas tranças
mas se um cabrito 
de cornadas mansas
abre a carteira e
generoso acode
e a puta FODE.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

folhas de Outono


É numa estreita mas razoavelmente longa marginal que contorna o rio, o sítio onde costumo estacionar o carro.
Do lado direito existe um passeio também ele estreito, porque ao longo dele e a preencher uma parte do seu espaço existe uma fileira de carvalhos.

Por este dias, as suas folhas começam a cair cada vez mais e de manhã e à tarde elas cobrem o passeio e uma parte do alcatrão da estrada. Parecem beijos de verão caídos no cinzento escuro de uma estrada anónima. Dá-me um prazer imenso arrastar os meus pés e ouvir o restolhar das folhas secas e olhar para trás e ver o rasto criado por eles, tal como um dedo traça a água quando ele desliza sobre ela.

Quando pego no carro, tenho frequentemente na parte do meu vidro da frente, o de trás nem tanto, coberto pelas folhas que foram caindo ao longo do dia. Não as retiro de lá. Deixo-as estar.
Com a deslocação do carro e à medida que vou andando de volta para casa elas vão-se soltando. Mas de vez em quando há uma ou outra que resiste até ao fim da viagem.
Ou porque ficam presas nos limpa para-brisas ou por ficarem retidas nas dobras do capot, ou então por capricho do destino resistiram à deslocação do ar sobre o vidro.

Mário Quintana, um poeta e pensador brasileiro questionava-se sobre as folhas de Outono sob a forma mais elementar da poesia japonesa (Hai-Kai):


Uma borboleta amarela?
Ou uma folha seca
Que se desprendeu e não quis pousar?


Então, essas folhas que se desprenderam mas que decidiram resolutamente pousar no vidro do meu carro indo nele até minha casa, guardo-as numa caixa. São as minhas Folhas de Outono.

Se o poeta Mário Quintana meditava sobre as Folhas de Outono, os músicos de jazz, Cannoball Adderley (saxofone alto) e Miles Davis (trompete) em 1958 no álbum Somethin' Else tocavam sobre elas - Autumn Leaves.

Quer um, quer os outros e à sua maneira, sabem perfeitamente como expressar e dar a saborear o quanto bonito o Outono é.







segunda-feira, 11 de novembro de 2013

já vai no quarto ano





O dia de São Martinho é um dia giro para celebrar o nascimento da Esteira de Letras.
Todos os anos é assim. Um belo prato cheio de castanhas assadas e um vinho alentejano a acompanhar.

É curiosa a dinâmica de um blog. Ao longo do tempo os tempos, a maneira, a forma e a estética de como se escreve muda, talvez para melhor, espero eu, talvez para pior, quase de certeza.
O que pensava há quatro anos atrás é diferente de agora e provavelmente até já nem escreveria alguns posts nos dias de hoje.
Lembro que inicialmente, a Esteira vivia do ódio de estimação a essa coisa que se chama José Sócrates que pirou-se para Paris e deixou o país num estertor financeiro. Qualquer coisa servia para escrever contra ele. Isso ainda hoje se mantém.
Mas com a sua saída de cena , a Esteira virou-se para outros temas bem mais do meu agrado e muito, muito mais úteis. 

O meu amor aos animais, o meu desejo de os poder proteger, o verdadeiro ódio a essa aberração que alguns covardes psicopatas sadicamente defendem que é a tauromaquia, o acreditar que amar não depende do sexo, o cinema, a poesia, a música - a minha paixão e necessidade - e o jazz em particular.

Recordo-me que nos primeiros tempos, a estatísticas dos acessos, do números de seguidores, media o sucesso do meu blog, da minha escrita, do que pensava.
Agora quatro anos depois, interessa-me muito mais se eu gosto dos meus textos, mais do que o que os outros pensam ou o número de visitas diárias.
Verdade, verdadinha, não é lá muito bem assim, mas já foi bem pior... ;)

Não deixa também de ser curioso, o quantas vezes estive para "matar" este blog. O tempo disponível e a disponibilidade para escrever foi diminuindo, e por (muitas) vezes também ainda fico frustradíssimo por uma página digital em branco me conseguir derrotar temporariamente ou ainda ser uma barreira difícil de transpor. Mas isso vai ser sempre :).

Manter um blog vivo é uma luta e um desafio. Todos os dias penso o que poderei mostrar, dar a conhecer, escrever o que penso, o que defendo, o que escrevo, sei lá tantas coisas.
Mas de alguma maneira ele foi conseguindo sobreviver. Ainda bem. Com mais ou menos letras (menos) ou com mais ou menos imagens (mais), a Esteira faz hoje quatro anos.
Não sei se estará melhor, mas certamente está um pouco diferente do que quando começou, o que até pode ser bom.

Parabéns a ela, parabéns a vocês que a lêem, parabéns aos meus seguidores públicos, parabéns aos meus seguidores privados, parabéns aos que caiem do céu em busca de algo para não mais voltarem, parabéns aos que comentam e aos que não comentam e já agora e porque não, parabéns a mim.

As castanhas já acabaram. A garrafa ainda não, mas também não é para acabar agora.
Espero que daqui a um ano volte a comer castanhas e a beber um vinhito alentejano tinto enquanto penso o que hei-de escrever a propósito do quinto ano da Esteira.

:)

série "estatísticas da vida" - LVIX






Todas as hipóteses deviam ter a mesma proporção... :D