terça-feira, 27 de setembro de 2022

porque me tornei veg (há dez anos)


A ideia ficou plantada e em estado latente quando escrevi o texto Lugares Macabros, baseado em fotografias tiradas pelo fotógrafo Tommaso Ausili num matadouro italiano, para o seu trabalho premiado intitulado Hidden Death - Morte Oculta.

Eu fecho esse texto desta maneira:
"Não advogo que se passe a praticar a alimentação vegetariana com base no argumento da defesa da vida do animal, porque desconhecemos se os vegetais (igualmente seres vivos) também não terão mecanismos de dor e sensação da proximidade de morte. Ou se o acto de os cortar ou arrancar da terra não será igualmente um acto de sofrimentos para os mesmos.
Mas claramente advogo e anseio por um maior respeito pelo animal, pela dignidade da sua morte e pela humanização do seu sacrifício por nós, seres humanos."
 
Entretanto tomei a decisão de em Setembro de 2012 de me tornar vegetariano. O que mudou desde este fragmento de texto para esta decisão foi a tomada de consciência da palavra senciente. Claramente uma das palavras mais importantes e relevantes da minha vida.
Pouco tempo depois aboli o leite e seus derivados, o mel e os ovos. 

Nessa altura percebi que os vegetais não eram seres sencientes, que não tinham um sistema nervoso central e que portanto não eram aplicáveis as palavras emoções, dor, sofrimento, consciência e adaptação ao meio que os rodeiam. Eles não sentem. 
Na remota possibilidade de o serem, também percebi que estes estão na base alimentar de qualquer animal que nós matamos (ou não) para consumo. Com este estatuto e do ponto de vista evolucionário não faz sentido que fossem capazes de produzir uma resposta senciente que lhes permitisse uma reacção eficaz a um estímulo que os ameaçasse. 

A compreensão que os animais não querem morrer, que têm medo, entram em pânico quando estão no corredor da morte, que de facto percebem o que acontece aos que estão na sua frente, foi assustadora para mim. Que as vacas, porcos, galinhas e tantos outros animais lutam e defendem as suas crias quando estas lhes são retiradas como uma mãe humana luta e defende os seu filhos, foi uma revelação profundamente emocional para mim.

Desde há várias décadas, já evoluímos a esse ponto, que a carne e o peixe deixaram de ser necessários para sermos saudáveis ou que o consumo dos mesmos signifique que a alimentação é equilibrada, bem pelo contrário. 
A carne proveniente dos mais diversos tipos de animais é alvo de administração maciça de antibióticos, hormonas de crescimento, corantes vermelhos porque o stress da morte iminente do abate nos animais altera-lhes a cor e textura da carne. Implica sofrimento e maus tratos de animais, más condições de condições de higiene, aglomeração excessiva de indivíduos em muito pequenas áreas.

A pesca, principalmente a sobrepesca, sofre com a contaminação de águas com metais pesados, presença de microplásticos, perda de biodiversidade e destruição de habitats marinhos. Coloca inúmeras espécies em risco de extinção ao não respeitar os respectivos ciclos de vida e reprodutivos, ao dizimar peixes de uma forma cega e destrutiva perturba as cadeias alimentares de todos os seres vivos marinhos. 
Em peixes de aquacultura as águas não são recicladas, não são renovadas e tratadas arrastando com isso rápidas propagação de doenças que nos podem afectar.
E a quantidade pescada é muito maior que aquela que é efectivamente consumida por muitas vezes ser deitado peixe já morto que foi indevidamente pescado fora das dimensões exigidas e que portanto não pode entrar no circuito comercial.

Mas, porque acima de tudo a morte de um animal, de um ser vivo consciente e senciente, que deseja viver, para nossa alimentação tornou-se num acto frio, impessoal, calculista e tremendamente desnecessário. Um desperdício de uma vida. De milhões e milhões de vidas sencientes.
E se há alguma sensibilidade razoavelmente generalizada, mas muito recente, perante o sofrimento que os animais passam ao longo da sua vida e durante o seu percurso num matadouro, há quase uma indiferença total perante o sofrimento que os peixes sofrem no momento da captura. Por os peixes não serem mamíferos como nós a nossa tendência é ignorá-los. 
Poucos sabem, ou têm a consciência, que a forma como o sofrimento de um peixe que morre fora de água (sufocado) é igual á forma ao sofrimento com que um mamífero morre (afogado) dentro dela.

Ter-me tornado vegetariano foi uma das decisões mais bonitas da minha vida. Foi um acto de amor e carinho perante o nosso belo e extraordinário planeta e perante todos os seres vivos que connosco o coabitam.

O discurso do australiano Philip Wollen abaixo está em inglês. Mas as legendas em português podem ser activadas.
É um discurso emotivo, esclarecedor e inspirador como poucos. 
Não costumo pedir às pessoas que se tornem veg mas tento mostrar quais as consequências do acto de não ser veg.
Este discurso explica isso na perfeição. Ouçam-no. São 10 minutos que podem mudar a vossa vida, a vossa percepção do mundo animal e melhor ainda, podem fazer algo de muito importante pelo mundo. 
Uma forma de estender a mão amiga a um planeta que precisa desesperadamente de todas elas.

Entretanto este mês celebro, orgulhoso, 10 anos de uma das decisões mais bonitas da minha vida.
Talvez tenha sido uma decisão tardia mas seria muito pior se não a tivesse tido.

Um brinde a todos os vegs e ao que fazemos em prol deste maravilhoso planeta 💚🌱🐾