sábado, 2 de maio de 2015

uma música para o fim de semana - Rodrigo Viterbo


Quando viajo uma das coisas que mais procura e que mais me faz viajar é o choque cultural. 
E quanto maior for este choque, mais marcante e importante será a viagem que estou a fazer.

Em 2002 viajei pela primeira vez para um país muçulmano, Marrocos. 
A primeira cidade que me acolheu foi Casablanca. À saída do aeroporto senti de imediato o significado de choque cultural. 

A cores, a arquitectura, a gastronomia, as roupas, a tez das pessoas, tudo gritava ao meu ouvido: Esta não é a tua cultura!

Dias mais tarde em Marrakech, ouvi o som que mais associo, ainda hoje, a viajar. Não é exactamente um som, mas um chamamento. A chamada para a oração muçulmana que é feito pelo muezzin.


Apesar de não ter viajado (ainda) para a Austrália e particularmente para o seu outback, o instrumento que por excelência representa a tribo Aborigene que habita esta inóspita área é o didgeridoo.
Ele é feito a partir de troncos ou ramos de árvores tornados ocos devido à presença de térmitas no seu interior e é tocado através da vibração dos lábios.
Pode ter vários comprimentos, mas o normal é cerca de dois metros de cumprimento. O seu som varia com o comprimentos e os materiais usados.
Mas em todos eles o seu som é muito ressonante, etéreo, algo espectral. Parece um ronronar de um gato bastante ampliado. 
É um daqueles sons que estão bastantes distantes da nossa cultura. Ouvi-lo remete de imediato para lugares distantes mesmo que não saibamos que lugares poderão ser. 

O portuense Rodrigo Viterbo com o(s) seu(s) didgeridoo(s) é um arauto desses países distantes. Talvez seja o português que mais tem divulgado os sons que saem dele e o que melhor domina a técnica da respiração circular para o poder tocar.

A música para este fio de semana chama-se Takas. Existem dois motivos para o seu nome.
Rodrigo explica que em 2009 teve um workshop com um mestre aborigene que lhe disse ao ouvir a sua música que ele estava numa "estrada". 
Acrescenta que Takas é uma palavra lituana que significa Caminho. E porquê uma palavra lituana e não australiana? Porque a sua namorada é lituana e em honra dela foi buscar a tradução da sua língua natal.


Pessoalmente, quando o ouvir ao vivo no seu lugar de origem, saberei de imediato que estou a experienciar um choque cultural.
Até lá, delicio-me e vou viajando nos voos dos sons que saem da sua extremidade.


Bom fim de semana :)





quinta-feira, 30 de abril de 2015

dia mundial do Jazz - Miles Davis (a prostituta de Bye Bye Blackbird)


Proponho duas alterações a este pequeno quinteto maravilha :)

Tiro o ratinho da flauta trocava-o por outro com um trompete. O ratinho da guitarra sai e no seu lugar punha outro com uma bateria. O resto da formação fica como está. Sem alteração.




Ou seja, temos um piano, um contrabaixo e a bateria, secção rítmica clássica, na linha da frente os sopros: saxofone tenor e o trompete.
Se dermos nomes aos ratinhos, temos respectivamente por esta ordem: Red Garland, Pul Chambers, Philly Joe Jones, John Coltrane e o líder de todos os ratinhos, Miles Davis.

Em 1955, precisamente quando este quinteto foi formado por Miles Davis ele ficou conhecido na história do jazz como o Primeiro Grande Quinteto de Miles Davis. Durou relativamente pouco tempo, mas tudo o que gravou ficou para sempre. 
Passados sessenta anos, os seus álbuns são de referência e nenhuma colecção de jazz digna desse nome pode estar isenta da sua presença.

Em 1957, com a entrada de Miles Davis no mundo das drogas, este quinteto de excepção desfaz-se.
Dando origem alguns anos depois ao Segundo Grande Quinteto de Miles Davis.
Exactamente os mesmo instrumentos, mas tocados por músicos completamente diferentes.
Miles Davis no trompete, Wayne Shorter no saxofone tenor, Herbie Hancock em piano, Ron Carter com o contrabaixo e Tony Williams na bateria.

Do primeiro quinteto existe um álbum seminal na sua carreira, lançado em 1957, que se chama Round About Midnight. Foi o primeiro álbum gravado para a Columbia por esta formação. 
É um álbum que gosto particularmente. A minha faixa favorita é a número 4 - Bye Bye Blackbird.

É uma canção escrita em 1926. A sua letra descreve uma prostituta que deixa a sua actividade e regressa a casa da mãe. Miles Davis dá a sua versão desta canção sem o suporte da voz. É de tal maneira bem sucedido e conseguida que a tornou sua. 
Falar de Bye Bye Blackbird é falar de Round about Midnight de Miles Davis.

Podemos tentar imaginar o que se terá passado.
Após uma breve introdução do piano e bateria, o trompete de Miles Davis entra de uma maneira introspectiva. Sem pressa. Com frases simples, sustentadas e economia de notas. A prostituta deixa o bordel, caminha lentamente na rua escura e vai remoendo as suas memórias, ainda absorta no passado recente.

Quando passa o protagonismo para Coltrane, o seu sax tenor torna-se mais rápido, mais nervoso, mais sobressaltado. 
Provavelmente será aqui que a prostituta se apercebe do que ficou para trás e o que tem pela sua frente. Está nervosa. Deu um passo importante na sua vida.

Na passagem de testemunho do saxofone para o piano de Red Garland, este baixa-lhe o nervosismo, torna-o mais saltitante e descontraído. 
Diria que a prostituta está contente. O que tem pela frente dá-lhe a esperança e o conforto que tinha perdido durante anos. 
Finalmente quando o piano transita e regressa ao trompete de Miles Davis este conclui o tema no mesmo registo com que o iniciou. 
Talvez, serenamente, na rua à noite, a prostituta chega a casa da mãe e dorme como nunca dormiu.





segunda-feira, 27 de abril de 2015

série "estatísticas da vida" - CXXII


Definitivamente um filme de James Bond.
Estoura já este ano e com o novo Aston Marin DB10. E a Monica Bellucci também está lá...