quarta-feira, 23 de novembro de 2022

um poema de... Alberto Caeiro


Sempre admirável, sempre profundo, sempre bucólico e muito mais metafísico do que aparenta e do que paradoxalmente afirma no primeiro verso do poema 5 do Guardador de Rebanhos.
Eis o meu poeta/ heterónimo preferido de Fernando Pessoa: Alberto Caeiro.


XXI

Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe um paladar,
E se a terra fosse uma coisa para trincar
Seria mais feliz um momento...
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural...

Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva...

O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja...

Alberto Caeiro, Guardador de Rebanhos







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