quinta-feira, 4 de novembro de 2021

o sublime (e sagrado) mundo de Arvo Pärt - Cantus in Memory of Benjamin Britten


Diz-se que "se a vida te dá limões então faz limonadas". Refaço esta frase e afirmo "se a vida te dá limões então ouve Arvo Pärt".

Para quem não conhece Arvo Pärt - fervoroso cristão ortodoxo nascido em Paide, actual Estónia, na altura parte integrante da antiga URSS, em 11 de Setembro de 1935 - aconselho vivamente que vão à procura da sua maravilhosa e sublime obra. 
Principalmente aquela que se situa após a sua auto-imposta reclusão, uma espécie de exaustão creativa, para reflexão e procura de uma nova forma de compor que durou entre os anos de 1968 a 1976. 
Pärt emerge deste período com uma técnica de composição muito própria que chamou de "tintinnabuli" (pequenos sinos) e que o tornaria um dos compositores mais influentes, não só do século XX mas também do século XXI. 
Ela leva-nos aos reinos do além, do divino e do espiritual. Entrelaça pontes entre o terreno e o sagrado, diálogos e reflexões entre a vida e a morte.

Sendo extremamente difícil para mim escolher uma peça, opto por ser apenas instrumental (deixo as corais para mais tarde), que vá ao encontro do parágrafo que abre este post, escolho, paradoxalmente com alguma facilidade, Cantus in Memory of Benjamin Britten. 
É uma das (várias) peças a que recorro com alguma frequência quando só tenho limões pela frente. É tudo o que podemos esperar de Pärt: espacial, imensa beleza, elegância a um nível raras vezes encontrado. É de uma simplicidade única, profundamente espiritual, capaz de falar com a nossa alma, capaz de nos fazer crer que existe algo superior (qualquer que seja o nome que possa ter).

Iniciando-se com três singelos toques de sino, pouco audíveis neste vídeo, este tema começou a ser composto por Arvo Pärt em 1977, após a morte do compositor britânico em Dezembro de 1976. Arvo afirmaria que pouco antes da morte de Britten tinha começado a admirar a pureza da sua música e que queria tê-lo conhecido pessoalmente. Sentia-se arrependido de não o ter feito porque a sua morte fez com que tal jamais acontecesse.

As suas obras corais são nobres e celestiais. Etéreas. Profundamente devocionais. Ora frágeis e ténues, ora poderosas e vibrantes, sempre envolventes, protectoras como uma manta que nos é colocada num dia frio. Os instrumentais são delicados. Frequentemente intensos e amplos, cheios de texturas, repletos de uma melancolia doce e de uma inexcedível beleza onde o silêncio (particularmente nas suas peças para piano) encontra espaço e tempo para se fazer ouvir por entre notas esparsas dos instrumentos musicais.

É um privilégio viver numa época em que este compositor está ainda vivo, poder conhecê-lo em tempo real sem que ainda se tenha tornado uma memória. No futuro, o seu nome será recordado, lido e ouvido na história da música. O seu legado musical perdurará nos tempos futuros ao lado de tantos outros nomes consagrados da música erudita, clássica e contemporânea. Nomes que aprendemos a ouvir, a admirar e a deixar que nos maravilhem.

Regressando ao Cantus in Memory of Benjamin Britten - uma obra pode ser encontrada em Musica Selecta, um duplo álbum que a editora alemã ECM lançou em 2015 para comemorar os 80 anos do compositor - ela emociona-me profundamente, chega ao meu âmago. É como se Pärt estivesse a falar comigo, a tocar na minha alma e esta o compreendesse. 
É notório que Arvo Pärt é um compositor pelo qual tenho um imenso carinho. É muito raro que isto aconteça. Para além dele, talvez só Tchaikovsky provoque e cause em mim esse sentimento, essa magia tão viva e tão especial.


"Eu posso comparar a minha música como a luz branca que contém todas as cores.
Apenas um prisma pode dividir essas cores e fazê-las aparecer;
esse prisma pode ser o espirito do ouvinte."

Arvo Pärt









2 comentários:

  1. Sem dúvida ☺️
    Toda a obra de Arvo Pärt é absolutamente excepcional, maravilhosa.
    É uma pena ser tão pouco conhecida. Experimente conhecer um pouco mais dela.
    Um beijinho e obrigado pelo comentário 😊

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