domingo, 27 de abril de 2014

um poema de... Vasco Graça Moura (no dia da sua morte)


Regra geral quando morre alguém que admiro muito, seja de quem área for, exclamo "Que merda!"

Significa que é alguém que faz falta, que era alguém que tinha mais para dar, que era alguém que já tinha dado muito, que a sua perda foi inesperada e acima de tudo era alguém que tinha conquistado a minha admiração e até afecto.
Há poucos minutos soltei esta mesma exclamação. A morte de Vasco Graça Moura apanhou-me de surpresa. Não sabia que sofria "de doença prolongada", como quem diz à socapa, cancro.

Conhecia muito pouco o lado político - fundador do PSD, secretário de estado e eurodeputado durante dez anos - e profissional de (advogado) Vasco Graça Moura.
Mas tinha e tenho, uma profunda admiração por toda a sua (vasta) obra literária enquanto homem de letras em todas as suas vertentes: ensaísta, cronista, tradutor, antologista, escritor, poeta e crítico, sem esquecer todo o seu papel na gestão da cultura nomeadamente, enquanto director RTP, da Imprensa Nacional - Casa da Moeda. e recentemente director do Centro Cultural de Belém.

Entre muitos e variados prémios literários, foi vencedor do Prémio Pessoa em 1995 e Prémio Virgílio Ferreira em 2007.
Ainda em 2007 haveria de ganhar o Prémio de Tradução do Ministério da Cultura italiano pela excelência da sua tradução da Divina Comédia de Dante Alighieri.

Era abertamente um acérrimo crítico do acordo ortográfico.




Enquanto poeta Vasco Graça Moura, tenho um profundo carinho por O soneto do Amor e da Morte. É um dos poemas mais bonitos, doces e sentidos da sua poesia.
Já aqui antes tinha colocado este texto a propósito deste mesmo soneto.

Volto a ele de novo. Nunca é demais rever ou reler o que é bonito.
Espero e desejo que tenha sido assim os seus últimos momentos.

😢


soneto do amor e da morte 

quando eu morrer murmura esta canção
que escrevo para ti. quando eu morrer
fica junto de mim, não queiras ver
as aves pardas do anoitecer
a revoar na minha solidão.

quando eu morrer segura a minha mão,
põe os olhos nos meus se puder ser,
se inda neles a luz esmorecer,
e diz do nosso amor como se não

tivesse de acabar, sempre a doer,
sempre a doer de tanta perfeição
que ao deixar de bater-me o coração
fique por nós o teu inda a bater,
quando eu morrer segura a minha mão.

Vasco Graça Moura, in "Antologia dos Sessenta Anos"



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