quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

um poema de... Álvaro Feijó


Os dois Sonetos de Amor da Hora Triste de Álvaro Feijó, foram os poemas que se ouviram a serem declamados pela voz gravada de Maria Barroso, no funeral que aconteceu ontem de Mário Soares no Mosteiro dos Jerónimos.

Não os conhecia de todo. São muito poderosos e ainda mais belos. São doridos e dolorosos de tanto saudosismo e romantismo que deles emana.
É de quem sente, de quem sentiu verdadeiramente a profunda emoção da despedida, da perda definitiva, numa esperança vã, mas esperança ainda assim, de que talvez não seja tão definitiva, tão eternamente perdida.
É um até já, para sempre.


I

Quando eu morrer - e hei de morrer primeiro
Do que tu - não deixes de fechar-me os olhos
Meu Amor. Continua a espelhar-te nos meus olhos
E ver-te-ás de corpo inteiro.

Como quando sorrias no meu colo.
E, ao veres que tenho toda a tua imagem
Dentro de mim, se, então, tiveres coragem,
Fecha-me os olhos com um beijo.

Eu, Marco Polo

Farei a nebulosa travessia
E o rastro da minha barca
Segui-los-á em pensamento. Abarca

Nele o mar inteiro, o porto, a ria...
E, se me vires chegar ao cais dos céus,
Ver-me-ás, debruçado sobre as ondas, para dizer-te adeus,


II

Não um adeus distante
Ou um adeus de quem não torna cá,
Nem espera tornar. Um adeus de até já,
Como a alguém que se espera a cada instante.

Que eu voltarei. Eu sei que hei de voltar
De novo para ti, no mesmo barco
Sem remos e sem velas, pelo charco
Azul do céu, cansado de lá estar.

E viverei em ti como um eflúvio, uma recordação.
E não quero que chores para fora,
Amor, que tu bem sabes que quem chora

Assim, mente. E, se quiseres partir e o coração
To peça, diz-mo. A travessia é longa... Não atino
Talvez na rota. Que nos importa, aos dois, ir sem destino?


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