quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Ary dos Santos 33


Soneto

Fecham-se os dedos donde corre a esperança, 
Toldam-se os olhos donde corre a vida. 
Porquê esperar, porquê, se não se alcança 
Mais do que a angústia que nos é devida? 

Antes aproveitar a nossa herança 
De intenções e palavras proibidas. 
Antes rirmos do anjo, cuja lança 
Nos expulsa da terra prometida. 

Antes sofrer a raiva e o sarcasmo, 
Antes o olhar que peca, a mão que rouba, 
O gesto que estrangula, a voz que grita. 

Antes viver do que morrer no pasmo 
Do nada que nos surge e nos devora, 
Do monstro que inventámos e nos fita. 


José Carlos Ary dos Santos


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