sábado, 19 de outubro de 2013

uma música para o fim de semana - Stan Getz


À frente do título do post de "uma música para o fim de semana" ponho sempre o nome do cantor e/ou músico que dá a voz ou o instrumento à música escolhida.
Este fim de semana fiquei num dilema.

Aproveitei a bolei da comemoração do centenário do nascimento do poeta brasileiro Vinicius Moraes, que teve uma fortíssima ligação ao música popular brasileira para escolher uma música onde estivesse bem demonstrada essa mesma influência. A escolha estava feita à partida. A Garota de Ipanema obviamente. A letra é dele.

Esta canção mais que brasileira é do mundo inteiro. Diz-se até que é a segunda canção com mais versões, do mundo depois do tema Yesterday dos Beatles. E acredito que sim.
O youtube está cheio delas. Mas há uma versão que gosto mesmo muito. Fui de imediato à procura dela.
É tocada por João Gilberto na viola, António "Tom" Carlos Jobim no piano, a voz da Garota é a de Astrud Gilberto, na altura a mulher de João Gilberto e por último e por causa dele a escolha desta música e versão, Stan Getz no saxofone tenor.

Daí o dilema. Ou dava a primazia a Vinicius de Moraes, o autor da letra ou subjectivamente e apenas por gosto pessoal escolheria o nome do saxofonista Stan Getz e injustamente ignoraria os restantes músicos, nomeadamente Tom Jobim. É fácil perceber quem ficou nas "gordas".

Há algumas curiosidades sobre esta canção.
A versão inglesa - The Girl From Ipanema - foi adaptada por Norman Gimbel.
Quer a letra, quer o título final são diferentes da original porque Vinicius não gostou delas.
A letra foi inspirada numa jovem chamada Heloisa que na altura tinha 17 anos e que passeava frequentemente em biquíni pela praia de Ipanema em frente ao bar onde Vinicius Moraes e Tom Jobim frequentavam regularmente.
Heloisa quando mais tarde soube que tinha sido a musa da canção, quando se casou, convidou Tom Jobim e a sua mulher para padrinhos de casamento.


Em finais da década de 50 do século passado, entre outros músicos, João Gilberto, Tom Jobim e o próprio Vinicius Moraes como letrista deram passos decisivos para a criação da Bossa Nova. Uma deliciosa mistura de música popular brasileira, particularmente samba, com jazz.

Aos poucos e poucos a Bossa Nova foi atraindo músicos de jazz oriundos de outras paragens, particularmente dos Estados Unidos da América e que ajudaram a espalhar por esse mundo fora este género musical tão típico brasileiro.
Stan Getz, Charlie Bird, Herbie Mann e Frank Sinatra estavam entre os nomes mais sonantes.

Por isso A Garota de Ipanema/ The Girl From Ipanema é um três em um. Tem Bossa Nova, Vinicius Moraes e Stan Getz.
Excelente.


Bom fim de semana :)




Olha que coisa mais linda
Mais cheia de graça
É ela menina
Que vem e que passa
Num doce balanço
A caminho do mar

Moça do corpo dourado
Do sol de Ipanema
O seu balançado é mais que um poema
É a coisa mais linda que eu já vi passar

Ah, por que estou tão sozinho?
Ah, por que tudo é tão triste?
Ah, a beleza que existe
A beleza que não é só minha
Que também passa sozinha

Ah, se ela soubesse
Que quando ela passa
O mundo inteirinho se enche de graça
E fica mais lindo
Por causa do amor


sexta-feira, 18 de outubro de 2013

centenário nascimento Vinicius de Moraes


Brasileiro, de Rio de Janeiro, Marcus Vinicius de Moraes nasceu há cem anos. Em 19 de Outubro de 1913.
Diplomata, poeta, escritor, cronista, muito ligado à música popular brasileira (MPB) pelas suas letras e até foi crítico de cinema, Vinicius foi um homem das mil palavras. Era boémio, apreciador de tertúlias e whiskey. Era também um homem de muitos amores e paixões. Casou nove vezes!
Como quase toda a gente que o conhece é a sua faceta de poeta que mais nos marca.

Dele, existe um poema - Soneto da Fidelidade - que considero maravilhoso, em parte devido ao último terceto.
Recorro frequente ao último verso deste terceto, para eu perceber, para eu não me esquecer, para eu consiga apreciar os momentos, os instantes bons, porque são estes que mais se aproximam da felicidade.

Recorro a ele para que que eu consiga, que eu tenha o dom de os eternizar enquanto eles estão presentes, enquanto os tenho, enquanto estão na minha mão, à frente dos meus olhos, enquanto os consigo escutar e ver.
Tudo o que é bom, que é belo, é efémero. Acaba sempre cedo por muito que durem. A arte de os eternizar enquanto estão presentes é um privilégio
Quando eles cessam, quando se esfumam, será na nossa memória, nas sensações que causaram, que viverão e se manterão. A magia dos bons momentos será eterna.
E então terão sido infinitos enquanto duraram. 





Soneto da Fidelidade

De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.

Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento

E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama

Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.


Vinicius de Moraes


quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Manifesto Holstee


Como em todos os manifestos há um idealismo presente. Uma revolta pacífica para sociedade, uma convocação para a anarquia ordeira.
Há sempre uma impraticabilidade associada. Considero sempre os manifestos como sendo escritos por espíritos bem intencionados e socialmente enjaulados que precisam de se soltar literariamente. Terem uma válvula de escape.

O Manifesto Holstee, que gosto muito, enferma dessa mesma incoerência. 
É bonito, inspirador, motivador, mas pouco útil. É utópico. É como proclamar que as classes sociais deveriam acabar, ou que todas as pessoas são iguais. Até deveriam, mas não podem e na verdade não são.

Dedicarmo-nos ao que mais desejamos é perigoso, porque nos retira tempo ao que não desejamos fazer mas que tem que ser feito.
Não podemos partir por aí fora a desistir dos nossos empregos, apesar de todos nós o querermos. São eles que sustentam as nossas vidas aferrolhadas a pesadas grilhetas.

Não podemos mudar o que desejarmos, mesmo que sejamos nós próprios porque também podemos mudar, influenciar algo que não pode ser alterado. A pessoa que está ao nosso lado, uma regra de conduta, a cultura de alguém, ou uma filosofa de vida diferente da nossa e que tem que ser respeitada. Podemos interferir em algo que nos permite tolerar uns aos outros, viver lado a lado.
É a clássica afirmação de que a nossa liberdade acaba onde começa a dos outros. É um facto.

Não podemos aproveitar todas as oportunidades porque arriscamos a perder a que não devemos, ou a única que verdadeiramente temos.
Viajar é maravilhoso, perdermo-nos numa viagem é um privilégio, mas usualmente não é viável ou até possível.
Ser emocional é óptimo. Darmos largas ao que nos vai na alma. Batermos com a porta com toda a força, libertamo-nos das dores, das frustrações, das obrigações sociais, gritar aos quatro ventos as nossas alegrias, os sonhos concretizados, mas também isso pode colidir com as emoções da pessoa que está ao nosso lado e lá se vai a convivência pacífica e saudável. 

Sinto-me permanentemente sufocado, por tudo o que me rodeia, por ter que ser um menino bonito, quando sou feio ou me apetece ser feio. Ter que seguir regras que não me apetece ou que me contradizem em termos daquilo que sou. Mas não quero pagar as consequências disso. E mesmo assim já as pago e já as paguei bem forte. Dolorosamente. Ser um menino feio e ser um espírito livre paga-se com dor. Com a nossa e com a das outras.
Tendo naturalmente para a anarquia, para a entropia por isso gosto muito deste manifesto.

Ele fala muito comigo e compreende-me. Identifico-me bastante com ele. Mas é utópico. O que é uma pena e um desperdício.
Pelo menos enquanto houver pessoas que orbitam à volta de outras pessoas segundo e seguindo regras que nos permitem fazer isso sem andarmos o tempo todo ao estalo uns aos outros.


Manifesto Holstee




segunda-feira, 14 de outubro de 2013