sexta-feira, 10 de julho de 2015

Orelhas de borboleta



Andar nas franjas da normalidade é complicado.
É uma chatice ser-se diferente, estar fora do grande número. Paga-se caro. É como andar de metro.

Ser pequeno não se chega às pegas que estão penduradas nos varões. Ser-se alto, leva-se com as pegas na cara porque as mãos vão seguras no varões.

Ou somos o anão, ou o gigante. Normal é que não.

Não é só a altura.
Tudo serve. O tamanho das orelhas, a cabeça, a marca da roupa que se veste, o que se lê, o que se ouve, o que se vê e como se vê.

O mundo não está feito para pessoas diferentes em termos físicos e muito menos na forma de como ele é pensado.
O mundo está formatado e gosta de pessoas formatadas. Sabe como lidar com elas. Estão ao seu gosto.
Mas quando este exclui, rejeita, as cartas que estão fora do baralho, as pessoas que não se encaixam num modelo padronizado e pré-determinado, pode estar a perder trunfos importantes. E pior que isso. Está a magoá-los.

Quem é diferente, tem obviamente um grande (o Mundo) e solitário (o Eu) problema para enfrentar: a sua diferença.

É aqui que surge o Orelhas de Borboleta.
É uma grande lição, muito terna, muito simples, sobre como a enfrentar.
Li em vários lados que é um grande livro para os educadores lerem aos putos. Talvez.
Mas não consigo imaginar quem melhor possa e saiba fazer isso que os pais.
Admitindo que o sabem fazer, admitindo que o querem fazer e que têm a paciência e o carinho para o fazer.

A mãe de Mara é uma dessas pessoas que sabem exactamente o que fazer e como o fazer.
Mara é uma menina carenciada e pobre. Isso torna-a diferente dos outros colegas de escola. É uma carta fora do baralho, desformatada. Não porque o fosse, mas porque a tornavam.

Através da mãe foi ganhando consciência das suas diferenças, daquilo eram consideradas e apontadas como fraquezas.
Com a sua ajuda, ela conseguiu transformar essas diferenças em pontos fortes, através de uma filosofia positiva e bonita.

" A Mara é orelhuda!"
"Mãe, tu achas que eu sou orelhuda?"
"Não filha. Tens é orelhas de borboleta."
"E como são as orelhas de borboleta?"
"São orelhas que revoluteiam sobre a cabeça e pintam as coisas feias de mil cores"

Depois depois vai desconstruindo, dando a volta sempre por cima e aumentando a sua auto-estima, tudo o que os colegas de escola apontam criticamente a Mara. 
O cabelo empastelado, a sua roupa, as suas meias rotas, sapatos velhos e tudo o que possa pensar.
Até a fome.

Mas maior que o problema e ainda mais solitário que ele, é a solução para a diferença. A integração do Mundo e do Eu num só conceito. Aceitar.

" A Mara é orelhuda! Ou vais dizer-nos que são orelhas de borboleta?"
"Não! São só orelhas grandes. Mas não me importa."


E o Pedro partiria livre. A voar...




2 comentários: