quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

um poema de... Eugéno de Andrade (no centenário do seu nascimento)


Eugénio de Andrade, pseudónimo de José Frontinhas Neto, nasceu exactamente há cem anos, na aldeia da Beira Baixa, Póvoa de Atalaia.
Começou a escrever poemas mesmo muito cedo, aos 13 anos. Publica o poema Narciso em 1939 e o seu primeiro livro, Adolescente, um livro no qual nunca teria um grande orgulho, em 1942.
Em Lisboa, em 1947 torna-se funcionário público trabalhando para o Ministério da Saúde.

Chega em força ao grande público quando publica em 1948 o seu livro "As Mãos e os Frutos", ganhando a admiração de poetas e escritores com o estatuto de Jorge de Sena e Vitorino Nemésio.
A partir daqui as obras sucedem-se com mais de cinco dezenas de títulos publicados de poesia, prosa e infantil. Conquista vários prémios - Grã-Cruz da Ordem do Mérito em 1989 e o Prémio Camões em 2001. Fez traduções de autores como Frederico Garcia Lorca e José Luis Borges.
Publica o seu último livro Os Sulcos da Sede em 2001. Morre a 13 de Junho de 2005, na cidade do Porto. No dia em que, 117 anos antes, nascia Fernando Pessoa.

Admiro nele a sua poesia ser simples, fluida, muito directa. Reflecte, mais uma observação, sobre a essência, o que é elementar, numa aparente singeleza sem uma excessiva transcendência ou busca de algo ou de uma entidade suprema. 
O seu poema As Palavras são um bom exemplo da sua escrita reservada e tímida.


As Palavras

São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.

Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.

Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.

Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?

Eugénio de Andrade





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