terça-feira, 17 de janeiro de 2017

um poema de...Miguel Torga (nos 22 anos da sua morte)


Ninguém conhece o Dr Adolfo Correia Rocha. Nasceu em 1907, na zona raiana de São Martinho da Anta, a rasar a cidade de Vila Real.

A sua vida de Adolfo, começa de uma maneira dura e atribulada. Com uns escassos 10 anos parte para o Porto. Bateu quase todos os postos humildes. Foi porteiro, moço de recados, limpava escadas e tratava de jardins.
Em 1918 frequenta o seminário. Toma contacto com os textos sagrados, com o latim e com outras disciplinas. Apesar de decidir que não quer tornar-se padre, será aqui as letras subtilmente entram em si,

Aos 13 anos parte vai para o Brasil para uma fazenda de um tio. Aqui foi capinador e vaqueiro. O tio reconhece-lhe inteligência manda de volta para Portugal e paga-lhe os estudos. Concluí os estudos do liceu e em 1928 entra na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra e torna-se otorrinolaringologista.
Verdadeiramente a medicina não era a sua paixão. No mesmo ano em que entra em Medicina, publica o seu livro de poesia Ansiedade.
A partir daqui, a sua obra literária, não para de crescer e torna-se vasta. Contam-se às dezenas os livros que publicou de prosa e poesia.

Em 1934, tinha 27 anos, o Adolfo Rocha toma uma decisão que o marcará, e nos marcará para a vida.
Decide honrar dois grandes escritores pelos quais tinha uma grande admiração, Miguel Cervantes e Miguel Unamuno.
Tal como as suas raízes serranas, bravias, da montanha, o escritor nunca esqueceu as suas origens, o arbusto torga, cujas cores podem ser brancas, rosadas e arroxeadas, no qual se reconhece e igualmente admira.
Junta os dois nomes e torna-se... Miguel Torga.

Ele é um contista de excelência, romancista, ensaísta, dramaturgo e um poeta extraordinário.
E é esta última face, a de poeta, que mais me atrai nele.
Miguel Torga morreu no dia 17 de Janeiro de 1995 em Coimbra. Faz hoje 22 anos.


Torga tem um poema, que prima pela delicadeza, pela elegância, que define maravilhosamente o que é a poesia.
Deveria ser, talvez, o primeiro poema que se deveria ensinar às crianças. Uma maneira de as tornar receptivas à poesia, de as fazer abrir os braços, a uma forma de literatura, muitas vezes, pouco admirada, pouco lida, pouco ouvida e muito pouco ensinada

"Não tenhas medo, ouve:" é pessoalmente, o seu poema mais bonito e singelo, o mais simples e puro.
É o que mais me atrai, o que mais me fascina e o que mais me ensinou.


Não tenhas medo, ouve:
É um poema
Um misto de oração e de feitiço...
Sem qualquer compromisso,
Ouve-o atentamente,
De coração lavado.
Poderás decorá-lo
E rezá-lo
Ao deitar,
Ao levantar,
Ou nas restantes horas de tristeza
Na segura certeza
De que mal não te faz.
E pode acontecer que te dê paz... 


Miguel Torga, diários XIII



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