quinta-feira, 26 de maio de 2016

Miles 90 - é oficial: gosto mais do Nefertiti do que do ESP!


Hoje faz noventa anos que Miles Davis nasceu. Um excelente argumento para passar este feriado a ouvir uma boa parte da minha discografia de Miles Davis.
Around About Midnight, Kind of Blue, Seven Steps to Heaven, My Funny Valentine, Milestones, Birth of the Cool, Bittches Crew, e mais uma boa meia dúzia de outros títulos.

Mas o objectivo estabelecido para o dia de hoje era desfazer uma indecisão entre dois álbuns que gosto imenso e que nunca tinha conseguido decidir qual o que gostava mais: Nefertiti ou ESP.
E ela durava desde que tinha comprado os dois.
Hoje fiz um mano a mano com eles :)

Ambos foram gravados com o segundo grande quinteto de Miles Davis.

Miles Davis - trompete
Wayne Shorter - saxofone Tenor
Herbie Hancock - piano
Ron Carter - contrabaixo
Tony Williams - bateria

ESP foi lançado em 1965 e Nefertiti em 1968.
Na capa de de ESP aparece Miles Davis com a sua mulher Frances da qual se separaria no final de 1965. Em Nefertiti a capa é um grande plano do perfil do rosto de Davis. Prefiro a capa deste último.

ESP tem um ambiente muito modal, muito na linha daquilo que tornou Kind of Blue lendário, uma ligação fortíssima entre o quinteto. E isso para mim é um trunfo fortíssimo, tipo poker de ases. 
Aliás o título ESP (Extra Sensorial Perception) surge devido à comunicação musical, compreensão, quase telepática que os cinco elementos da formação tinham entre si.
ESP fascina-me por esta envolvência.

Nefertiti é um passo em frente ao desconhecido. 
O tema que dá nome ao álbum, Nefertiti, quebra, inverte as regras do jogo. 
Trompete e Saxofone surgem ligados um ao outro, sem primazia de nenhum, num longo ostinato, uma frase musical  que se repete ao longo do tempo, enquanto a secção rítmica (piano, bateria e contrabaixo) vai brilhando lá atrás, construindo o tema e com solos, por cima dos sopros.
E é muito difícil escapar ao hipnotismo de Nefertiti. O álbum arrasa logo no primeiro tema.
No segundo, Fall, reconhece-se a mesma filosofia, o mesmo ostinato de trompete e saxofone mas um pouco mais libertos, menos retritivos.
Os restantes temas seguem sonoridades diferentes, por vezes atonais, mais abstractos, menos formais mais rápidos.

Ouvi ESP pela segunda vez e este confirmou: estava em casa, sabia onde estavam as coisas, podia descansar. Era bom. Fechava os olhos, sentia o fluir da tranquilidade a passar por mim.
Da segunda vez, Nefertiti transmitia uma certa sensação de inquietação e de imprevisibilidade. Era como se fosse a minha casa, mas arrumada por outra pessoas. Tinhas as minhas coisas na mesma, mas numa ordem diferente. E às vezes estavam mal empilhadas e caiam.
A influência de Wayne Shorter como compositor e arranjador estão muito mais presentes e influentes em Nefertiti que em ESP o que é um trunfo fortíssimo.
Shorter compôs Nefertiti, Fall e Pinocchio. Herbie Hancock tem à sua responsabilidade duas faixas uma das quais é uma das minhas favoritas, Madness a outra é Pinocchio.

ESP é aquele álbum que se pode pôr a tocar quando temos alguém em casa, Algo que já não o faria tão confortavelmente ao colocar Nefertiti.
Demorei mais tempo, ao longo do tempo, para gostar de Nefertiti do que ESP.
Mas reparei também que talvez oiça mais vezes Nefertiti que ESP.

Ficou decidido hoje, aquilo que inconscientemente já sabia. Nefertiti é superior!
E se soubermos os trabalhos que este segundo quinteto de Miles Davis iriam lançar nos anos seguintes a este trabalho, percebemos que Nefertiti é uma poderosa antecâmara para a maior evolução que o jazz viria a conhecer depois do free: a fusão.









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